Dia Nacional do Deficiente Visual marca luta pela inclusão e garantia de direitos
Você tem uma vida aparentemente normal. Um dia ao sair de casa sofre um acidente. Ao acordar não consegue enxergar nada. Você está totalmente cego. Este ensaio sobre a cegueira, não faz parte de um romance de José Saramago. Este é um relato de Sérgio Luiz Breder Júnior, que perdeu a visão após sofrer um acidente aos 26 anos.
A perda do sentido não freou Sérgio. Após ficar cego ele se formou em Direito e passou no concurso do INSS. Agora parte para outra etapa: a prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
No dia 13 de dezembro foi celebrado o Dia Nacional da pessoa com Deficiência. A data foi criada em 1961 para incentivar o princípio da solidariedade humana, mundialmente estabelecido no princípio da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que preserva o Direito Fundamental de igualdade dentro da mesma sociedade, sem discriminação.
Segundo o último Censo do IBGE, hoje no Brasil há mais de 6,5 milhões de pessoas com deficiência visual no Brasil. Esta data marca um dia de luta contra o preconceito, pela inclusão e pelos direitos destas pessoas.
A propósito, andar por uma cidade onde a acessibilidade é precária, tanto pelas calçadas quanto na maioria dos estabelecimentos pode ser assustador e perigoso para estas pessoas que tem os mesmos direitos garantidos pela Constituição Federal e pela LBI, que é a Lei Brasileira de inclusão nº 13.146.
“Na verdade em Manhuaçu não existe acessibilidade para pessoas com deficiência visual tendo em vista que a mobilidade urbana aqui é muito reduzida nas questões de calçada e transporte urbano, como exemplo, então praticamente não temos acessibilidade para deficientes visuais em Manhuaçu”, diz Sérgio.
Para ele, em uma cidade já considerada polo já deveria haver uma polícia pública estabelecida para auxiliar os deficientes visuais. “Já é de longa data que os chefes do executivo não tem essa sensibilidade de se preocupar com a mobilidade urbana. Aqui não existe calçada. São poucos os locais em que você consegue transitar com uma marcha normal. Para o deficiente visual é praticamente impossível. Então infelizmente nós fomos deixados à mercê de administrações que não tem essa preocupação”.
Atravessar a rua, andar pelas calçadas e ir ao supermercado, se tornam obstáculos e não surpreendentemente se tornam objetos de superação para estas pessoas que se superam todos os dias ao realizarem suas tarefas diárias.
Perguntado sobre o piso tátil instalado no centro da cidade Sérgio explica que a obra não atende às demandas exigidas pela LBI. “Infelizmente o piso tátil que foi implantado no centro de Manhuaçu foi feito de uma forma totalmente irregular. Primeiro que não precisaria ter sido retirada as pedras portuguesas. Era só ter sido feito o caminho do piso tátil onde seria instalado. E outra questão é que o piso tátil tem que ser feito próximo à parede, porque o deficiente visual ele bate a bengala parede-chão. O piso tátil foi colocado próximo ao meio fio. Ele faz curva, e o piso tátil não pode ter curvas. Existem locais no centro que se a gente for usar o piso tátil, e já aconteceu comigo, você bate no poste, na árvore, bate numa lixeira. Então ele é totalmente inviável. Foi um dinheiro jogado fora”, explica.
Além do perigo de se transitar pelas ruas das maiorias das cidades brasileiras, Sérgio ainda mostra a importância da participação dos portadores de deficiência visual no processo de implantações de sistemas de acessibilidades em qualquer tipo de deficiência. Segundo ele o usuário final nunca, ou raramente é chamado para testar e aprovar a obra. “Hoje no mercado existem do várias empresas que já estão habilitadas a fazer este tipo de habilitações. Porém, sempre que se vai fazer uma obra relativa à acessibilidade nunca se chama o usuário final que é o deficiente pra dar o aval dele. Porque às vezes a empresa instala um piso tátil, mas não chama um deficiente visual. Faz-se uma rampa, mas não se chama um cadeirante para saber se ela ficou da forma correta, da forma que dê pro usuário usufruir de uma forma tranquila”.
Na LBI, em diversos artigos é abordado que é de responsabilidade do município a reforma e o cuidado das calçadas nos perímetros urbanos relativo à questão da acessibilidade. Não somente nas ruas, empresas, lojas e supermercados também tem a obrigação de oferecer acessibilidade. “A gente enquanto deficiente visual espera que os novos governantes, assim como as empresas, venham se preocupar com essa condição,” diz Sérgio.
A deficiência visual pode ser definida como a perda total ou parcial da visão. Este problema pode ser congênito ou adquirido e representa, para muitos, uma grande limitação. Entretanto diversas técnicas de aprendizagem e de inserção no mercado de trabalho permitiram que a deficiência visual se tornasse um detalhe diante da capacidade de seus portadores. Este tipo de deficiência ainda pode ser classificada como cegueira ou baixa visão. Entretanto ambos necessitam aprender a usufruir melhor dos outros sentidos como a audição para adquirir melhor qualidade de vida.
Pessoas portadoras de baixa visão utilizam materiais com letras ampliadas ou até mesmo lentes de aumento. Porém, existem diferentes condições visuais e cada uma deve ser tratada de maneira individual.
“No art. 57 da LBI, fala que as empresas públicas e privadas tem a obrigatoriedade de instalar pisos táteis em seus estabelecimentos para orientar o deficiente visual no hall de entrada, por exemplo. Isso não acontece muito em Manhuaçu em alguns mercados, algumas grandes lojas aqui. Não temos esse piso tátil. Inclusive até em estabelecimentos bancários notamos que em alguns lugares ainda não se preocuparam com isso e os órgãos competentes também não tem feito a fiscalização que é devida”, ressalta Sérgio que espera que com o novo governo assumindo Manhuaçu no dia 1º de janeiro, tenham mais sensibilidade procurando saber das demandas das pessoas portadoras de deficiência visual.
A lei brasileira determina também que sejam reservadas até 20% das vagas de concursos públicos para pessoas com deficiência. O número é determinado pelo organizador do concurso e publicado no edital. As regras que o Ministério do trabalho aplicado utilizadas em concursos públicos também se enquadra ao setor privado que tem a obrigatoriedade de contratar estas pessoas.
Projeto para inclusão social de portadores de deficiência visual
O projeto “Atitude”, desenvolvido por Sérgio Luiz e Fernando Portes tem como objetivo reunir os deficientes visuais da região para saber quais são as demandas, os problemas e as necessidades reais dos deficientes. Segundo ele a ideia surgiu ao perceberem que estas pessoas não são “tão assistidas como deveriam ser em nossa região.”.
“Eu entro na área de informática, para dar aula de software para os deficientes que são os leitores de tela. O Fernando entra com a questão da mobilidade, onde são oferecidas as aulas de bengala e AVD (Atividade de Vida Diária)”, conta. Sérgio explica que o projeto está na sua fase inicial e a pretensão é a de montar uma associação na cidade.
O projeto já atende pessoas de Manhumirim, Muriaé, Carangola, vila Nova, entre outras cidades da região. Aos interessados, Sérgio deixa o número de telefone disponível por onde é feito o primeiro contato. Logo depois é feito um cadastro. “Temos marcado reuniões para saber quais são as demandas dessas pessoas, como está o andamento nas escolas, aquelas que não tem tido o acesso garantido por lei em colégio procuramos buscar a Secretaria e ver o que pode ser feito para ajudar essas pessoas”
Sempre recordando, que o dia 13 de dezembro é um dia de conscientização, mas é preciso estar atento já que não é somente em um dia que devemos nos conscientizar sobre a real situação dos portadores de deficiência visual.
“O dia 13 de dezembro é o dia que se comemora o Dia do Deficiente Visual, mas o deficiente visual vive a deficiência todos os dias. A gente sofre muito preconceito por parte das pessoas que não conhecem a deficiência. Eu moro sozinho, tenho uma vida normal. Cozinho, passo, lavo. Me formei em direito depois de cego, então o deficiente visual tem as suas limitações, mas tendo boa vontade, ele consegue ter uma vida praticamente normal, desde que tenhamos acessibilidade. Na faculdade eu tive alguns problemas, mas consegui com todas as minhas dificuldades, fui me adaptando e consegui formar e graças a Deus estamos aí. Vamos passar na OAB agora e vamo que vamo!”, conta.
Entre os cegos, os motivos principais para o problema são doenças como catarata, glaucoma e retinopatia diabética. Portadores de miopia, astigmatismo e hipermetropia não são considerados deficientes visuais.
Telefone para entrar em contato com Sérgio é o (33) 98409-9004
Danilo Alves / Livia Ciccarini – Tribuna do Leste