A capoeira é uma representação cultural que mistura esporte, luta, dança, cultura popular, música e brincadeira. Desenvolvida no Brasil por escravos africanos, foi tombada em 2008 como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco. É difundida de modo oral e gestual, nas ruas e nas academias, bem como das relações sociais e familiares construídas entre mestres e discípulos. O Instituto de Capoeira Brasileira (ICB) existe há 10 anos em Belo Horizonte. Trazido para Manhuaçu em 2016, ensina essa arte a cerca de 80 jovens e crianças. “Uma forma de ir na contramão dos demais. É um grupo totalmente voltado para o desenvolvimento da arte e da cultura da capoeira, onde nós valorizamos e transformamos o Instituto de Capoeira Brasileira em uma verdadeira família. Aqui essa palavra tem um significado muito forte, por estarmos em colaboração, estarmos sempre juntos, caminhando juntos em todos os momentos, sempre pregando o respeito ao próximo”, explica Mestre Marcelinho, responsável pelo Instituto.
Na época do Brasil colonial, os escravos necessitavam de desenvolver algum tipo de proteção contra a violência e repressão dos colonizadores brasileiros. Eram constantemente alvos de práticas violentas e castigos dos senhores de engenho. Quando fugiam das fazendas, eram perseguidos pelos capitães-do-mato, que tinham uma maneira de captura muito violenta. O nome capoeira vem do indígena “o que foi mata”, por meio da conexão dos termos ka’a (“mata”) e pûer (“que foi”). Em alusão às áreas de mata rasa do interior do Brasil onde era feita a agricultura indígena e por onde diversos escravos fugiam dos engenhos. Os senhores de engenho proibiam os escravos de praticar qualquer tipo de luta. Logo, os escravos utilizaram o ritmo e os movimentos de suas danças africanas, adaptando a um tipo de luta. Surgia assim a capoeira, uma arte marcial disfarçada de dança. Foi um instrumento importante da resistência cultural e física dos escravos brasileiros.
Mestre Marcelinho conta que, ao redor do Brasil, grande parte dos projetos de capoeira são trabalhos sociais, voltados para o benefício da comunidade. Em Manhuaçu, o ICB ensina capoeira de forma gratuita a jovens e crianças da cidade, algumas, inclusive, em situação de vulnerabilidade social. “Eles encontram no Instituto uma nova família. Temos alunos com histórias bastante difíceis, que a gente tem que lidar no dia a dia, procurando dar uma orientação, acompanhamento, até mesmo com os pais a gente costuma conversar. E a capoeira tá aqui pra isso, pra abraçar essas causas e fazer com que se sintam acolhidas no ICB”, aponta o mestre.
O código penal de 1890, criado durante o governo do Marechal Deodoro da Fonseca, proibia a prática da capoeira em todo o território nacional e, reforçado por decretos que impunham penas severas aos capoeiristas, este código só fez aumentar o ódio e as perseguições dos chefes de polícia que tentavam a todo custo fazer valer a lei contra a capoeira. O motivo de tanta perseguição era o que a capoeira trás em toda a sua essência, ou seja, a liberdade. A capoeira foi uma prática proibida no Brasil entre a criação da República, em 1890, e 1937 até ser reconhecida como um símbolo da identidade brasileira. Em 2014, a Roda de Capoeira foi declarada Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco, mas ainda assim tem que conviver com o preconceito. Mestre Marcelinho conta que, em Manhuaçu, muitas pessoas confundem a capoeira com religiões de matrizes africanas, como o Candomblé e a Umbanda. “A capoeira não tem nenhuma ligação com qualquer religião, o capoeirista, sim, pode ter sua religião. A capoeira é totalmente independente, criada na ânsia da liberdade”, explica.
O Instituto de Capoeira Brasileira chegou a Manhuaçu em 2016, graças à Instrutora Guerreira, que conheceu o projeto em Belo Horizonte. “Eu iniciei na capoeira em 2012, num projeto feito pelo CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) e, com o tempo, desenvolveu em mim a vontade de dar aulas. Quando era pequena, dizia que queria ser médica para cuidar das crianças e trabalhar de branco. Ainda não sou médica, mas cuido das crianças e trabalho de branco. Conheci o Mestre no final de 2016 e falei com ele que queria dar aulas aqui na cidade. Através de um, dois, foi crescendo, até chegar no dia de hoje”
O trabalho da Instrutora Guerreira tem sido reconhecido nacionalmente. Na próxima semana, haverá o Encontro Nacional de Capoeira, em Manhuaçu, reunindo cerca de 40 mestres de todo o Brasil e colocando a cidade no mapa cultural do país.
Junto do evento, acontece a troca de graduações dos alunos do ICB, como acontece em outras modalidades de luta. O evento que acontecerá no sábado, dia 11, na Faculdade do Futuro, às 15h.
João Vitor Nunes – Tribuna do Leste