
As previsões indicavam um volume grande de chuvas que poderia cair em Manhuaçu e região na semana, entre os dias 23 e 24 de janeiro. Porém, ninguém esperava que as consequências do período provocassem a maior enchente da história de Manhuaçu. As informações de que uma possível cheia do rio Manhuaçu começou a ser veiculada no dia 20 de janeiro, quando autoridades municipais e setores ligados a previsões climáticas alertavam para consequências desastrosas em função das fortes chuvas que iriam cair na região – a exemplo de um temporal registrado no mesmo dia, quando a parte central da cidade foi totalmente tomada pelas águas que desciam das partes mais altas, bem como a incapacidade dos bueiros em receber a quantidade de água despejada pelo temporal.
Com isso, os primeiros sinais de que a cidade mergulharia em um caos em sua infraestrutura começava a preocupar órgãos municipais – seja através de buracos nas ruas da cidade, vídeos de salvamento de pessoas levadas pelas enxurradas e a previsão de tempestade subtropical Kurimí para Minas Gerais – em especial a Zona da Mata, Espírito Santo e Rio de Janeiro.
Com isso, o grupo de Gerenciamento de Crise, formado por setores da Prefeitura de Manhuaçu – como Defesa Civil, Secretaria de Obras, bem como a Polícia Militar e Corp o de Bombeiros se reuniram para planejar ações para o período de chuvas, tendo em vista os alertas emitidos pela Coordenadoria Estadual da Defesa Civil, que apontava para a grande quantidade de chuvas que poderia cair em todo o estado, e consequentemente, Manhuaçu e região. Moradores se mostravam preocupados, pois não sabiam o que fazer ao presenciar as contínuas cheias do Rio Manhuaçu. A esperança era de que as chuvas cessassem e o afluente diminuísse a sua cheia gradativamente. Entretanto, o cenário foi completamente oposto, as incidências de água não pararam e ao contrário do que se imaginava aumentou assustadoramente a sua quantidade, passando a chover quase que ininterruptamente por 12 horas. Todo este contexto esteve compreendido no dia 24 de janeiro, véspera da tragédia que viria a atingir Manhuaçu, Luisburgo, Matipó, Abre Campo e diversas outras cidades da região.
Por volta das 23h do mesmo dia, os primeiros sinais das cheias do rio apareciam em alguns pontos da cidade, como na ponte da rua Luiz Cerqueira – no qual o entulho ficou preso entre a passagem da água e a ponte e na Praça Martins Fraga, que se encontrava totalmente alagada em sua parte mais baixa, próxima a um estabelecimento de lanches da cidade. No local, os moradores começavam a fazer a retirada dos móveis de sua residência de forma desesperada para fugir da tragédia que começava a dar os primeiros sinais. “Choveu muito e estamos próximos do rio. Portanto, estamos próximos deste risco”, anunciava o dono do comércio de lanches, Ricardo Muniz, já ciente de que a enchente em Manhuaçu era questão de tempo. À meia noite do dia 25, a praça da Rua Júlio Bueno já estava tomada pelas águas do rio Manhuaçu – era o início do pesadelo para os moradores da chamada “parte baixa” da cidade. A jovem Ana Luiza, de apenas 14 anos, se mostrava preocupada com a chuva que caía sem parar e com as águas do Rio Manhuaçu que acompanhavam a mesma situação do período chuvoso. “Várias pessoas subiram os seus móveis para o segundo andar das casas e outras utilizando carros para fazer a retirada dos bens. A situação é preocupante,” alertava a jovem.
Percorrendo as ruas da cidade a equipe do TL constatou o cenário de terror que moradores e comerciantes começavam a passar em função da enchente. Moradores fazendo a retiradas de seus bens, comércios abertos e funcionários fazendo a retirada dos produtos, desesperados por conta das cheias do rio que aumentavam em um nível frenético. Alguns detentos também foram retirados da Delegacia de Polícia Civil por causa das cheias. À 01h04 a Técnica em Defesa Civil, Vininha Nacif, informou que o Rio Manhuaçu estava alagando diversos pontos de Manhuaçu e a enchente estaria tomando as ruas da cidade, e nas “cabeceiras” continuava chovendo forte, principalmente em Luisburgo. “A cidade já está acumulando prejuízos”, salientou.
Desastre
O dia 25 janeiro ficará guardado na memória das pessoas que moram em Manhuaçu, ou possuem algum vínculo com a cidade, como a data da maior enchente da história da cidade. O cenário era desolador, com todas as pontes tomadas pelas águas – partindo a cidade em “duas” e deixando milhares de pessoas ilhadas, pontos de referência, a exemplo da “ponte dos arcos”, completamente submersas, e o acesso à cidade que estava, quase que em sua totalidade, nulo. Com isso, profissionais da Coordenadoria Estadual da Defesa Civil chegaram em Manhuaçu juntamente com membros do 11º Batalhão do Corpo de Bombeiros, com sede em Ipatinga, Tenente Coronel Alexandro Nunes, para auxiliar as autoridades municipais no momento de crise. O objetivo era catalogar as perdas – principalmente humanas, caso houvessem, e traçar uma linha de trabalho pós período de enchente. “Todas as autoridades devem se unir para enfrentar este momento sinistro”, esclarecia o Tenente Coronel Alexandro Nunes.
Paulatinamente, as águas começaram a retroceder no período da tarde, e, com isso, os prejuízos começaram a aparecer. Às 15:15h comerciantes da Avenida Salime Nacif começavam a tentar retirar a lama e o entulho que adentraram os respectivos comércios ainda desnorteados com a inundação que assolou Manhuaçu durante a madrugada, manhã e início da tarde do dia 25 de janeiro. “Acompanhei as enchentes de 1997 e 2009 e também conversei com meu pai que viu a famigerada “enchente de 79”, mas a de 2020 foi a que mais nos surpreendeu por causa da velocidade em que a água subiu. Em questão de uma hora ela cresceu um metro dentro do meu estabelecimento. E por isso não tivemos tempo de salvar muita coisa”, disse o comerciante Leandro Soares. A praça do Terminal Rodoviário, que abriga uma pista de skate, também apresentava sinais da enchente que havia passado pelo local. A água estava retrocedendo e a partir daquele momento era hora de contabilizar os prejuízos.
Retomada
No dia 27 de janeiro, a contabilização das perdas e danos finalmente puderam ser avaliadas pela população e órgãos reguladores municipais e estaduais. A quantidade exacerbada de lama e entulhos trazidos pela água caracterizava o nível emergencial em que a cidade se encontrava. E os setores municipais, juntamente com as entidades estaduais, começaram a pôr em prática as normativas traçadas para o período pós enchentes. A Secretaria Municipal de Saúde de Manhuaçu, mesmo com suas unidades de atendimento reduzidas, ofereceu o atendimento à população em todas as suas unidades. A Secretaria de Obras de Manhuaçu procedeu, e vem realizando, a limpeza das ruas da cidade por meio de maquinários pesados para a retirada da sujeira que impregnou os pontos da cidade. A Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social iniciou os trabalhos de recolhimento de doações através da solidariedade da comunidade e montou pontos de coleta e distribuição em três locais da cidade: o Poliesportivo Municipal, a Igreja Santo Antônio, em frente ao estádio JK, a Igreja São José no bairro Bela Vista e a unidade “Casa”, localizada em frente a quadra da Escola Polivalente.
Em relação a população, a limpeza era intensa e solidária. Vizinhos se ajudando na remoção da sujeira ou fornecendo materiais necessários para a retirada dos entulhos que se acumulavam dentro das residências. “Será um trabalho árduo de recuperação. Estou pelejando desde as cinco e meia da manhã desta segunda-feira, 27, mas temos que começar. A vontade é de fechar o olho, ir embora e não olhar para trás, mas isso não vai acontecer, pois temos força de vontade. Deus está para provar que temos capacidade de retomar a vida e reerguer nosso estabelecimento”, disse Ricardo, o mesmo dono de estabelecimento citado no início da matéria, que infelizmente acabou perdendo parte de seus materiais.
Ponte do Silva
No distrito a comunidade desenvolveu um mutirão de limpeza que reuniu caminhões pipas, e muita água para a retirada das lamas. A comunidade também foi bastante afetada pela enchente que adentrou Ponte do Silva e derrubou casas, comércios, danificou a ponte da comunidade e, como em outros locais, trouxe lama e entulho. A moradora Elozane explicou que o momento é de união e de amor ao próximo, pois o mais importante permaneceu, ou seja, a vida das pessoas atingidas pela enchente. “Ficamos assustados com a enchente. Na minha casa, a água ficou a um degrau de entrar no segundo andar. Mas passou, e o momento agora é de ajudar o próximo”. Outra moradora de Ponte do Silva, que também estava participando do mutirão, Luciane, evidenciou que a situação era de união. “O pessoal do Córrego dos Hott também trouxe água potável para nos ajudar, e outras pessoas também nos ajudaram com doações de roupas e alimentos para os mais afetados pela enchente. Estamos limpando para reconstruir, pois Graças a Deus, perdemos os bens materiais, mas estamos com saúde e isto é o mais importante”, destacou.
Vila Formosa
Os moradores também contabilizaram os prejuízos provocados pela enchente. Casas e carros estavam completamente tomados pelo barro advindo da tragédia. Moradores tentaram realocar seus imóveis para o segundo andar, mas sem sucesso, em decorrência do aumento dás águas do rio São Luís – que subiu mais de 4 metros na localidade. Em função das cheias, muitas pessoas perderam seus bens e necessitavam de auxílio das autoridades. “Não acreditava que viria uma enchente dessa proporção. Mas quando ela chegou, invadiu minha casa e me deixou ilhado. Uma peça pesada veio junto com as águas e acabou destruindo parte da minha casa. Podemos dizer que eu perdi tudo, porque os materiais que estavam embaixo da casa – máquina de lavar, camas, geladeiras, fogão, foram carregados pela força das águas”, disse o morador Joselino.
Emergência
No dia 26, o Governador Romeu Zema acompanhou a situação na região de Manhuaçu. Durante a tarde, ele sobrevoou as cidades de Manhumirim, Alto Jequitibá, Alto Caparaó, Espera Feliz e Caparaó e esteve na cidade de Manhuaçu para avaliar os danos causados pelas chuvas. O governador informou que assinou decreto declarando situação de emergência em 47 municípios mineiros, muitos deles da região. A Defesa Civil estadual irá mobilizar todos os órgãos estaduais nas ações de resposta e reabilitação dos cenários. O decreto também facilita a aquisição de bens necessários para as atividades visando à recuperação das cidades.
“Tanto o Governo do Estado, por meio da Defesa Civil, como o governo federal têm se empenhado para que as áreas atingidas sejam reparadas o quanto antes. A grande prioridade no momento é ajudar essas pessoas. E assim que o tempo melhorar e os danos forem levantados, nós daremos prosseguimento com essa reparação. O próprio ministério do Desenvolvimento Regional vai receber, a partir dessa semana, das próprias prefeituras e da nossa secretaria de Infraestrutura e Mobilidade, aquilo que já há de danos com mais detalhes para que ele possa separar alguma verba, para que essas obras sejam feitas com a maior agilidade possível”, afirmou.
Danilo Alves



